É com prazer e satisfação que nós, do Grupo de Estudo Marxismo e Geografia, retomamos nossas atividades do blog que, após 3 meses sem publicações, porém com atividades, iniciamos mais um ano com muita luta.
Sabemos que muita fatos ocorreram nesse breve intervalo de tempo, como o massacre de Israel na Palestina, o que confirmou a resistência do povo árabe, a continuidade da resistência da classe trabalhadora em toda Europa, a marcha dos Zapatista nos dias derradeiros de 2012. Enfim...
Nossa primeira comunicação de 2013 é um dos debate que estamos consolidando no Grupo. O texto a seguir foi publicado na V Semana de Geografia da UEPB, em Setembro de 2012.
Wendell
Salustino Leite de Oliveira
Universidade
Estadual da Paraíba.
Email:wendellsax@gmail.com
Alexandre
Peixoto Faria Nogueira
Universidade
Estadual da Paraíba.
Email:
alexandrepfn@gmail.com
Resumo
A terra é o apoio físico ao qual o homem promove
suas habilidades de sobrevivência. Não há como falar de ser humano sem ligá-lo
a terra, remetendo-o as suas origens, ao seu território, além das normas, estas
mantém o mínimo de concórdia entre os indivíduos da sociedade. Regras,
principalmente, referentes à propriedade, a qual se tornou um direito
fundamental na Revolução Francesa, especificamente, na Declaração dos Direitos
do Homem e do Cidadão, em 1789, definido no art. 17 como “um direito inviolável
e sagrado, do qual ninguém pode ser privado”. No Brasil, com a elaboração da
Lei de Terras de 1850 a terra tornou-se uma mercadoria valiosa, deixando os
pobres, escravos e índios sem usufrui-lá, legalizando, assim, a concentração
fundiária. É a partir disso que se desenvolve o trabalho, seguindo a função
social da terra e do homem, com o intuito de construir uma análise crítica à
Constituição e as leis que aportam à questão agrária brasileira. E atribuindo-a
os parâmetros históricos e socioeconômicos para uma (re) distribuição de terra,
tendo em vista que o direito à propriedade é certificado (Constituição Federal,
art. 5º, XXII: é garantido o direito de propriedade), e ainda ressaltando que,
na mesma Constituição, a propriedade tem que exercer, de maneira obrigatória,
sua função social (CF, art. 5º, XXIII: a propriedade atenderá a sua função
social). Para percorrer as vias deste trabalho, apoderou-se de consultas
bibliográficas, de comentários e análises sobre a relação entre Direito (leis;
Constituição Federal de 1988, principalmente, a Lei n. 8629/93, o Estatuto da
Terra, a Lei de Terras de 1850, o Código Civil no seu art. 502 e o Código Penal
Brasileiro no art. 161) e luta pela terra. A interpretação crítica que se
retrai das normas e conceitos, ao reputá-los, é que o homem ao semear ou
praticar o manejo da terra faz com que esta detenha sua função social, tendo em
vista que ela trará não apenas o bem estar do seu titular, entretanto com uma
produtividade com padrão suficiente e uma relação de trabalho justa acarretará
em uma amálgama benévola a comunidade. E, mais ainda, o ser humano encontra no
trabalho, que esse seja perante o seu pedaço de chão, o seu ofício na
sociedade.
Palavras-chave: Concentração
Fundiária; Direito Agrário; Luta pela terra.
Introdução
A terra é o apoio físico ao qual o homem
promove suas habilidades de sobrevivência.
Ela é sua pátria, é sobre ela que o homem constrói seu teto, cultiva seus
alimentos e ainda edifica sua lápide. Não há como falar de ser humano sem
ligá-lo a terra, remetendo-o as suas
origens, ao seu território. Assim, suscitaram normas, principalmente, referente
à propriedade, a qual, concernente Araújo (1999, p. 156) se tornou um direito
fundamental na Revolução Francesa, especificamente, na Declaração dos Direitos
do Homem e do Cidadão, em 1789, definido no art. 17 como “um direito inviolável
e sagrado, do qual ninguém pode ser privado”.
No Brasil, podemos constatar, a partir
de um resgate histórico, que o direito à propriedade sofreu com as ações dos
“grileiros”, que utilizavam de artifícios fraudulentos para adquirir a posse da
terra. Esmiuçando o problema fundiário brasileiro, em especial a questão da
concentração fundiária, destacamos a Lei de Terras de 1850, nesta época o
sistema escravocrata e a monocultura encontravam-se em decadência e havia a
necessidade de troca da mão de obra escravagista pelo trabalho assalariado,
principalmente a partir da força/imposição da Inglaterra para desenvolver seus
mercados.
A Lei de Terras 1850, atinente Stedile
(2005), tornou a terra uma mercadoria valiosa, deixando os pobres, escravos e
índios sem usufrui-lá, legalizando, assim, a concentração fundiária. Diante
disto, o sistema da Lei de Terras, com a escassa política de suporte ao
provimento e desenvolvimento da pequena propriedade e a fraca estrutura
administrativa empenhada ao cumprimento do texto de lei, servindo aos
interesses dos ricos, acabou por conceber mais desigualdades e prejuízo aos
camponeses, destituindo-os da propriedade da terra. Uma das consequências da
expropriação dos camponeses e dos trabalhadores rurais das suas terras foi o
êxodo rural, apesar de alguns permanecerem no campo, embora tivessem que ocupar
terras quase que improdutivas, no caso daqueles que foram para cidade, estes
eram considerados desqualificados perante os postos de trabalho que existiam,
assim, na tentativa de permanecerem nas cidades, ocuparam áreas de encostas
íngremes que os burgueses não ousaram comprar, resultando na formação de
favelas, agravando, consequentemente, a violência e a desigualdade social.
Sobre a
criação da Lei de Terras no Brasil, Martins afirma que:
Ao contrário do que se deu,
por exemplo, nas zonas pioneiras americanas, a Lei de Terras institui no Brasil
o cativeiro da terra – aqui as terras não eram e não são livres, mas cativas. A
Lei 601 estabeleceu em termos absolutos que a terra não seria obtida por outro
meio que não fosse à compra. (1984, p. 72)
Ainda sobre
a Lei de Terras e suas conseqüências, Moreira & Targino (1997) colocam que:
Com a lei de Terras de 1850,
a terra se valoriza e adquire importância mercantil e o estabelecimento da
propriedade privada é reforçado no Brasil e por rebatimento, na Paraíba. (p.
50)
Com o fim
da via de acesso à posse da terra através do uso, garantiu-se a implementação
dos direitos dos grandes latifundiários ao domínio das terras estruturadas na
monocultura predominante da época, a cultura cafeeira.
A Lei de Terras 1850, atinente Stedile
(2005), tornou a terra uma mercadoria valiosa, deixando os pobres, escravos e
índios sem usufrui-lá, legalizando, assim, a concentração fundiária. Diante
disto, o sistema da Lei de Terras, com a escassa política de suporte ao
provimento e desenvolvimento da pequena propriedade e a fraca estrutura
administrativa empenhada ao cumprimento do texto de lei, servindo aos
interesses dos ricos, acabou por conceber mais desigualdades e prejuízo aos
camponeses, destituindo-os da propriedade da terra. Uma das consequências da
expropriação dos camponeses e dos trabalhadores rurais das suas terras foi o
êxodo rural, apesar de alguns permanecerem no campo, embora tivessem que ocupar
terras quase que improdutivas, no caso daqueles que foram para cidade, estes
eram considerados desqualificados perante os postos de trabalho que existiam,
assim, na tentativa de permanecerem nas cidades, ocuparam áreas de encostas
íngremes que os burgueses não ousaram comprar, resultando na formação de
favelas, agravando, consequentemente, a violência e a desigualdade social.
No campo, o favorecimento do Estado ao
latifundiário expandiu a concentração de terras, deixando uma parte destas
improdutivas, ocasionando a extinção da função social da terra, a qual é
exercida pela adequada utilização econômica da terra e na sua justa repartição,
a atender ao bem estar da coletividade, almejando o crescimento da
produtividade e ao acesso a justiça social.
A diferenciação social e a renda
capitalizada da terra, que produzem a expropriação e a miséria, geram a luta
pela terra. A ocupação é o primeiro passo para a territorialização desta luta.
Todavia, em alguns casos os “invasores”[1]
cometem o crime de esbulho possessório, cujo se configura pela invasão de
imóvel alheio com violência à pessoa ou grave ameaça, ou mediante cooperação de
mais de duas pessoas, previsto no Código Penal Brasileiro no art. 161, do qual faz
parte no § 1º, inciso II.
É a partir disso que se desenvolve o
trabalho, seguindo a função social da terra e do homem, fazendo uma análise
crítica à Constituição que leva em conta os parâmetros históricos e
socioeconômicos para uma (re) distribuição de terra, tendo em vista que o
direito à propriedade é garantido (Constituição Federal, art. 5º, XXII: é garantido
o direito de propriedade), e ainda ressaltando que, na mesma
Constituição, a propriedade tem que exercer, de maneira obrigatória, sua função
social (CF, art. 5º, XXIII: a propriedade atenderá a sua função social).
Para percorrer as vias deste trabalho, apoderou-se de consultas bibliográficas, de comentários e análises
sobre a relação entre Direito (leis;
Constituição Federal de 1988, principalmente, a Lei n. 8629/93, o Estatuto da
Terra, a Lei de Terras de 1850, o Código Civil no seu art. 502 e o Código Penal
Brasileiro no art. 161) e luta pela
terra.
Conflito pela
terra: O papel do Direito Agrário, função social e as normas (anti)
constitucionalistas
O embate pela posse da terra se
fundamenta na concentração fundiária no qual é muita terra a poucos donos, isto
se permeia desde o Brasil colônia e deixa um incontável número de famílias na
faixa da pobreza. Segundo Nogueira (2009), em pleno século XXI o quadro agrário
brasileiro tem apresentado um panorama complexo e contraditório onde a ordem
tem sido a luta e os conflitos por terra, no entanto, esse panorama vem se
perpetuando ao longo do tempo. O país
com suas políticas capitalistas fornecem subsídios a nata de latifundiários,
assim, como afirma Rodrigues (2012)::
Dessa
forma, o espaço agrário brasileiro se caracteriza por relações sociais em que a
classe dos proprietários exerce um monopólio territorial para subordinar e
explorar os camponeses. Estes, por sua vez, resistem contra a expropriação e
lutam na busca pela garantia de seus direitos.
É fundamental se conseguir um equilíbrio
entre o campo e a cidade, esse é a área do Direito agrário. Ele tem por base
assegurar a produção de alimentos, em conciliação com a conservação dos
recursos naturais renováveis, fazendo emitir a função social da terra.
Destarte, traz para si a proteção de quem desempenha atividade agrária situada
no ordenamento fundiário, seja proprietário ou não da terra. (MIRANDA, 1988)
Quanto à função social da terra, diz
Araújo (1999):
A terra
cumprirá a sua função social quando, explorada eficientemente, possa contribuir
para o bem-estar do seu titular, e de sua família, mas atendendo também às
necessidades da comunidade, produzindo alimentos para o consumo do povo e
matéria-prima para atividade transformativa, gerando empregos, elevando a renda
per capita pelo aumento da produtividade e estabelecendo o equilíbrio entre as
diversas camadas sociais, de modo a tornar efetivo o desenvolvimento rural e
assegurar a justiça social. (ARAÚJO, 1999, P. 162)
Não diferente na doutrina
jurídico-agrária cuja: “a função social da propriedade consiste na correta
utilização econômica da terra e na sua justa distribuição, de modo a atender ao
bem estar da coletividade, mediante o aumento da produtividade e da promoção da
justiça social”. (ARAÚJO, 1999, p. 160)
Desde sua insurgência, o Direito Agrário
positivo adotou a concepção de função social a partir da Lei n. 4.504/64[2]
– o Estatuto da Terra, o qual não definiu a função social da terra, apenas
fixou requisitos essenciais para esta. Mais recentemente, a Lei n. 8.629/93[3],
também se absteve da responsabilidade de conceituar a função social da
propriedade rural, somente elaborando os requisitos já existentes na CF de
1988, em seu art. 186.
Quando a terra não atinge a sua função
perante a sociedade pode ocorrer à ocupação (ou invasão). A conduta de invasão
é um fato social permeado por um ataque aos bens patrimoniais. O qual o Estado
detém o cargo de proteger, abalizado na defesa dos bens jurídicos individuais,
da investida de quem causa tumulto a posse e/ou a propriedade alheia.
(MANÍGLIA, 1999)
Há um entrave entre ocupação e invasão,
que se insurgem por causa da não utilização da terra, principalmente por
latifundiários. Aos olhos dos atuantes dos movimentos sociais do/no campo
existe uma irrefutável distinção, enquanto ocupar concerne em tomar posse de
uma área; invadir refere a apoderar-se violentamente da terra. No entanto, na
esfera do Direito não existe diferença entre ambas, “a respeito de tal posição,
pensamos que ocupar e invadir, num sentido penal, tem o mesmo significado, pois
ambas as atitudes representam adentrar em imóvel alheio.” (Op. Cit. 1999, p.
140) Todavia, os trabalhadores penetram à propriedade rural sem violência
expressa ou ameaça, apenas com o escopo de se firmarem no terreno e
principiarem seus plantios ou, então, outra atividade designada à área
agrícola. Portanto, atinente a este trabalho, faz-se abnegável a igualdade
entre ambos, pois um se abstém de violência e outro só existe com esta.
Para Fernandes (2012), no Brasil, a
ocupação efetivou-se em uma primordial forma de acesso à terra. Nos últimos
anos, ocupar latifúndios procede a principal ação da luta pela terra. Por meio
das ocupações, os sem-terra espacializam a luta, conquistando a terra e
territorializando o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra - MST. E o
autor ainda continua citando a ocupação como um ato que os trabalhadores
sem-terra desenvolvem, combatendo a exclusão procedida pelos capitalistas e/ou
pelos proprietários de terra. A ocupação é, portanto, uma forma de
materialização da luta de classes.
Segundo
Nogueira (2009), a luta pela terra é um processo complexo que assume diferentes
formas. Situa-se dentro do contexto da luta pelo espaço e pela ruptura do poder
de poder. Nessa medida, a conquista do espaço liga-se à procura da identidade
social.
Ainda
segundo o autor, ao apresentar a ocupação como forma de acesso a terra, esta é
compreendida como ação de resistência essencial à formação campesina no interior
do processo contraditório do desenvolvimento do capitalismo. Sobre isto afirma
Oliveira (1991):
O Capital não expande de
forma absoluta o trabalho assalariado, sua relação de trabalho típica, por todo
lugar, destruindo de forma total e absoluta o trabalho familiar campesino. Ao
contrário, este, o capital, se cria e recria para que sua produção seja
possível, e como ela pode ter também uma criação, de novos capitalistas (p.20).
Sobre o
processo de ocupações de terras, Franco García, M. (2004) afirma que:
Através
da ocupação de latifúndio e terras devolutas, a estrutura organizada do espaço
se transforma. Entram em cena novas formas de gestão do território: os
acampamentos e assentamentos rurais (p.65).
Atinente ao assunto, Mayla Yara Porto
(apud MANÍGLIA. 1999, p. 140) menciona que a ocupação é semelhante à greve: um
instrumento que os trabalhadores possuem para se defenderem, o qual não deve
ser reprimido pelo governo democrático. Desta forma, ela protege que os ocupantes
(e não invasores) não são uma massa sanguinária, regida pelo gozo da
destruição, como assim são citados, mas, sim, pessoas que pagam um preço
elevado para que outras possam deliciar das benesses que delas são usurpadas.
Consoante Maníglia (1999), no que
concerne a perturbação da propriedade alheia, a qual pode ser oriunda da
ocupação, diz:
A
conduta da invasão tem sua origem num problema social de razões profundas, que
provém de um descumprimento constitucional aliado a fatos históricos, onde a
marca de uma dominação econômica e social imperaram. Não se pode isolar o
delito da invasão, sem ter em vista a dimensão fática em que o mesmo ocorre,
como, também, não deve limitar a análise do esbulho sem estudar as
consequências que advêm de tal atitude ilícita. A morte, a ameaça, a lesão, o
terror que engrossam as fileiras da criminalidade rural brasileira decorrem da
luta para obter a propriedade, dentro da esfera rural. (Op Cit., 1999, p. 139)
A análise do crime não pode se limitar a
esfera do Código Penal, o qual o ato ilícito será punido por violar a tutela de
bens, valores e interesses sociais. Essa deve reunir toda a estrutura
socioeconômica que o circunda, e, também, o individuo infrator.
A invasão da terra pode ser tipificada
como delito. Exemplo disto é o crime de esbulho possessório, o qual sua
definição penal encontra-se inserida no Capítulo do Código Penal Brasileiro
sobre a Usurpação (Cap. III do Título II – Crimes contra o Patrimônio). Assim o
diz, em seu art. 161 do supracitado Código, do qual faz parte no § 1º inciso
II:
“Da Usurpação
(Alteração de limites)
Art.
161. Suprimir ou deslocar tapume, marco, ou qualquer outro sinal indicativo de linha divisória,
para apropriar-se, no todo ou em parte, de coisa imóvel alheia:
Pena
– detenção, de um a seis meses e multa.
§
1º. Na mesma pena incorre quem:
(Usurpação
de águas)
I
– Desvia ou represa, em proveito próprio ou de outrem, águas alheias.
(Esbulho
Possessório)
II
– invade, com violência a pessoa ou grave ameaça, ou mediante concurso de mais
de duas pessoas, terreno ou edifício, para o fim de esbulho possessório.
§
2º. Se o agente usa violência, incorre também na pena a esta cominada.
§
3º. Se a propriedade é particular, e não há emprego de violência, somente se
procede mediante queixa.”
Ainda falando do crime de esbulho
possessório, transpassa duas características: os profissionais de invasões,
como assim o nomeiam; e milhares de famílias, que o praticam por não terem
opção e o cometem por instinto de sobrevivência. E que é cabível de um julgamento
distinto nos casos. Como assim deferi a autora Maníglia (1999, p. 153):
Com
referência à personalidade do agente, sabemos que muitos que praticam o esbulho
possessório são qualificados como profissionais de invasões, norteados por
ações antidemocráticas e interesses pessoais. Mas, também, temos conhecimento
de que milhares de famílias praticam tal ato com a finalidade de mostrarem suas
dificuldades, clamando pelos direitos de uma vida digna, quando não agem pelo
instinto de sobrevivência. A isto cabe a investigação devida, no sentido de
aclarara distinção dos casos. (MANÍGLIA, 1999, p. 153)
Para Scaloppe (1987),
Promotor de Justiça, há requisitos legais que, por muitas vezes, sustentam a
violência no campo e por isto alguns quesitos precisam ser revistos pelas
autoridades governamentais. Exemplo disto, a Lei Fleury (Lei 5491/73) - que permite ao condenado aguardar em liberdade o
julgamento do recurso -, embora tenha
sua vertente positiva, é um instrumento nos conflitos rurais para amparar os
jagunços e pistoleiros, contratados pelos latifundiários. Para o promotor de Justiça Marco Aurélio Lima do
Nascimento, essa lei é um "entulho autoritário, um resquício da
ditadura", e serve de instrumento para garantir a impunidade dos
criminosos que dispõem de condições econômicas para pagar bons advogados. E,
ainda continua, "por mais hediondo que seja
o crime, o criminoso nunca vai para a cadeia, porque pode se valer de uma
infinidade de recursos judiciais, que retardam a aplicação da justiça por dez,
vinte ou trinta anos".
Deste modo, a luta dos
trabalhadores e lideranças sindicais, a fim de revogarem leis como essas,
solidificam-se com fundamentos, “pois, sem dúvida, a aplicação do referido
dispositivo recai em situações que, por força da realidade, beneficia, quase
sempre, uma classe de privilegiados, onde não se incluem os trabalhadores
rurais”. (MANÍGLIA, 1999, pag. 145)
Um
pé nas leis e outro no bem estar comunitário – Em caráter de consideração
A interpretação crítica que se retrai das
normas e conceitos, ao interpretá-los, é que o homem ao semear ou praticar o
manejo da terra faz com que esta detenha sua função social, tendo em vista que
ela trará não apenas o bem estar do seu titular, entretanto com uma
produtividade com padrão suficiente e uma relação de trabalho justa acarretará
em uma amálgama benévola a comunidade. E, mais ainda, o ser humano encontra no
trabalho, que esse seja perante o seu pedaço de chão, o seu ofício na
sociedade. Para Engels (2012), o trabalho “é a condição básica e fundamental de
toda a vida humana. E em tal grau que, até certo ponto, podemos afirmar que
‘ele’criou o próprio homem”.
Além disso, as Leis, em seu princípio
ideário, intenta harmonizar, embora favoreçam seja direta/indiretamente a
classe burguesa, o embate entre os camponeses e os latifundiários. Comumente o
poder da propriedade privada fada ao esquecimento dos desapropriados, que um
dia trabalharam cultivando as terras que outrora ou recentemente lhe foram
tomadas. As consequências, principalmente a diferenciação social fundiária,
podem ser revertidas, no instante em que o poder público, o Estado em
consonância, seja enérgico ao aplicar uma reforma agrária concreta e
estrutural, que dote de subsídios o campesinato, dando-lhes aparatos de se
reproduzirem social e territorialmente. Nesse sentido, os camponeses adquirem
uma melhor qualidade de vida, após uma reforma agrária estrutural que atenda
seus interesses, tornando-os cidadãos com seus direitos realmente assegurados.
Faz jus a criação de
uma Justiça Agrária cuja tomará o papel, condicionado pelo Estado, a fim de ter
um controle social ou até superar as contradições socioeconômicas do campo, conforme Scaloppe (1987). Com esta
ação, os magistrados teriam que analisar cada situação, principalmente com o
princípio de equidade – é um dos meios que o juiz pode utilizar para superar
algumas lacunas na Lei, podendo abrandar e/ou adequar as noras a um determinado
caso -, personalizando os indivíduos e buscando perscrutar o fato concreto. Tudo
isto em concordância com os princípios da Justiça Social, apoderando-se das
doutrinas humanistas do Direito Agrário.
Referências
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função social. In: LARANJEIRA, Raymundo. Direito agrário brasileiro. São
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BRASIL. Estatuto da terra, Lei
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ENGELS, F. Sobre o papel do
trabalho na transformação do macaco em homem. Disponível em:
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FERNANDES, Bernardo Mançano. A
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FRANCO GARCÍA, M. A luta pela
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Faculdade de Ciência e Tecnologia,
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legal das invasões de terra. In: LARANJEIRA, Raymundo. Direito agrário
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Luanna Louyse Martins. Disputa territorial e Justiça: um olhar sobre a
violência no campo paraibano. Dissertação de mestrado. NPGEO/UFS, Junho de
2012. 258fls.
[1] Prescrito no Código Penal
Brasileiro em seu art. 161, § 1º inciso II.
[2]
Esta Lei regula os direitos e obrigações concernentes aos bens imóveis rurais,
para os fins de execução da Reforma Agrária e promoção da Política Agrícola. (Art. 1º)
[3] Esta Lei regulamenta e
disciplina disposições relativas à reforma agrária, previstas no Capítulo III,
Título VII, da Constituição Federal. (Art.
1º)